quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Reconhecendo um ressentido

       Em todas as camadas das sociedades, em todas as épocas, ao lado dos tiranos, próximos dos heróis aristocratas e dos camponeses, estava a figura do ressentido. O ressentido se camufla perigosamente: pode ser a pessoa aparentemente mais virtuosa. É especialmente comum em frases como “o que importa é o coração”, “o essencial é invisível aos olhos”. O histórico de um ressentido é sempre o de comparação com alguém: as notas de outro, a beleza de outro – aparentemente o ressentido não tem um caminho próprio, uma identidade, uma personalidade. Uma das formas mais asquerosas de obter atenção é através da pena. Ninguém gosta de ver o mais forte agredindo o mais fraco, a mais bela escarnecendo a mais feia, o mais poderoso oprimindo o mais débil. A reação gerada é tão perigosa, ou até mais venenosa que a situação original: o ressentido quase sempre se esconde atrás da máscara de fraqueza, de feiura, de debilidade para obter poder.
    
  Uma mulher casta pode se orgulhar de sua castidade dizendo ser uma virtude cultivada...mas pode também ser tão sem qualidades que foi incapaz de atrair quem quer que fosse. O homem que vocifera contra a canalhice de seus compadres, em terem diversão desregrada com diversas mulheres pode ser um indivíduo incapaz de conquistar uma companhia para si. O homem pobre pode dizer o quanto o rico é mesquinho, e ser, ele próprio, tão mesquinho quanto: mas sem a fortuna necessária para ostentar poder. O fraco pode ser tão cruel quanto o mais forte, mas incapaz de exercer poder sobre quem quer que seja.

         Qualquer que seja o ressentido, ele pode, estando em grupo, espalhar a mediocridade entre seus pares e sob a alegação de vingar o mal causado pelo par oposto – o aristocrata sádico – substituir uma tirania por outra pior. O império dos ressentidos é facilmente reconhecido pela modéstia e incapacidade: Misses universos feias, maus administradores, péssimos cozinheiros, tudo com uma ostentação de humildade e virtudes imaginárias. Qualquer reação ao horror dessa nova ordem, deve gerar um comentário do tipo: “mas como assim, você está tentando humilhar o fulano? É nisto que consiste a morte a morte da aristocracia: música e artes horríveis, PhD’s analfabetos, especialistas de porra nenhuma e um coro de mimados ressentidos reagindo a qualquer um que tente atestar o óbvio – o morto importa mais que o atestado de óbito.

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